Quando o diabo salvou uma família de anões em Auschwitz
Medo

Quando o diabo salvou uma família de anões em Auschwitz



O maior conflito armado da história da humanidade foi um evento que certamente mostrou o lado mais terrível do lado humano, mas também é palco de histórias admiráveis. Mesmo que um dos personagens da história abaixo seja uma das pessoas mais controversas e terríveis desse conflito, o final da história foi feliz para os envolvidos. Convido a todos os amigos e amigas a acompanharem essa história que nos foi indicada pelo amigo e colaborador Elson Antonio Gomes.


A história transborda protagonistas de terríveis biografias no campo de extermínio de Auschwitz. A que contamos neste artigo, ainda que sendo um relato salpicado de crueldade e menosprezo, tem um final feliz. É a história dos Ovitz, a família de judeus romenos anões que sobreviveu ao campo nazista. E uma frase que poderia resumir esta narrativa foi pronunciada por Piroska Ovitz: - "Fomos salvos pela graça do diabo!". O "diabo", em questão, tinha nome, sobrenome e apelido: Josef Mengele ou Todesengel, o Anjo da Morte.

Os Ovitz, originários de Rozavlea, na Transilvânia, foram, e são, a família com maior número de membros afetados por acondroplasia, a causa mais comum de nanismo. O rabino Shimshon Ovitz, também anão, se casou duas vezes com mulheres de altura normal e teve ao todo 10 filhos, 7 deles anões: cinco mulheres (Rozika, Franzika, Frieda, Elizabeth e Piroska, a caçula nascida em 1921) e dois homens (Avram e Micki).

Com poucas possibilidades de conseguirem um trabalho digno por causa de sua condição e também porque carregavam o sangue de artista nas veias -seu pai antes de se tornar rabino foi badchen, uma espécie de comediante ou animador de festas-, fizeram da necessidade uma virtude e criaram a Troupe Lilliput.


Durante anos a Troupe Lilliput, composta por todos os membros da família, percorreu a Europa com um espetáculo de música e humor no qual os anões eram os artistas e os irmão de altura normal trabalhavam nos bastidores. Apesar de sua condição de anões e judeus -uns e outros foram vítimas das políticas nazistas de higienização da raça-, os primeiros anos da guerra não foram muito difíceis para os Ovitz, inclusive ampliaram o número de membros com casamentos e alguns nascimentos.

Tudo mudou, entretanto, em 19 de maio 1944 quando toda a família foi presa na Hungria e, como o restante dos judeus, foram levados à Auschwitz. Já no campo, e enquanto desciam do vagão, um dos oficiais que os recebeu ficou impressionado ao ver sete anões elegantemente vestidos -foram presos enquanto atuavam- e que, ademais, eram membros da mesma família. Sabedor da paixão obsessiva do doutor Josef Mengele -médico oficial do campo há um ano- por experimentar com humanos, pensou que seria uma boa ideia avisá-lo... e foi.

Quando Mengele viu a família, separou-os do resto de prisioneiros e ordenou que arrumassem dependências especiais para seus novos "hóspedes/cobaias".

- "Agora tenho trabalho para mais de 20 anos", disse o médico com os olhos brilhando.

Aquele capricho do destino, salvou-lhes a vida. Para Mengele aquela família - sete membros com o mesmo transtorno genético- era como a Pedra de Roseta em sua experimentação para a reprodução seletiva da raça ariana. De fato, até aquele momento, as vítimas favoritas do Anjo da Morte foram os gêmeos, pelo fato de serem cópias um do outro.

Muitos gêmeos faleceram em seu experimentos, mas havia apenas uma família de anões, de modo que se preocupou que, enquanto não estivessem no laboratório, sua estadia não fosse especialmente dolorosa, e inclusive no trato com eles era cordial e se fazia chamar de "tio" pelos membros mais jovens. Mas no laboratório, coitados, voltavam a sua condição de cobaias humanas, segundo as palavras de Elisabeth Ovitz:

"As experiências mais terríveis de todas eram as ginecológicas. Eles nos amarravam à cama e começava a tortura. Injetavam coisas no útero, extraíam sangue, nos futucavam, furavam e tiravam amostras. A dor era insuportável.

Não sei se nosso físico influiu em Mengele ou se os experimentos ginecológicos se completaram. De qualquer forma pararam e começaram outros. Extraíram líquido da nossa medula espinal; lavavam nossos ouvidos com água extremamente fria ou quente, o que nos fazia vomitar. Depois começaram a cortar o cabelo, e quando já estávamos a ponto de sucumbir, iniciaram dolorosas testes nas regiões da cabeça, nariz, boca e mãos."


O fato de que alguém desaparecesse do campo era um sinal inequívoco de que teria sido gaseado, por isso, em várias ocasiões, acharam que os anões tinham morrido. Mas não, era o próprio Mengele que os tirava do campo, vestidos com suas roupas das atuações, para levar a suas conferências ou inclusive os fazia atuar para amenizar seu tempo de lazer (porque não era mole essa coisa de torturar e assassinar, até o Anjo da Morte tinha tempo para se divertir). A vida de cobaias terminou em 27 de janeiro de 1945 quando o Exército Vermelho libertou o campo. Josef Mengele conseguiu fugir.

Graças ao diabo, todos os membros da família Ovitz que tinham chegado ao campo (12 ao todo) conseguiram sobreviver a Auschwitz. Em 1949 emigraram a Israel e instalaram-se em Haifa. Alguns meses depois voltaram ao teatro mambembe com a Troupe Lilliput quando passaram a apresentar alguns números baseados em suas vivências no campo.

Após 6 anos de turnê, decidiram pôr um ponto final e o grupo de dissolveu. Piroska Ovitz foi a última a morrer em 2001, sendo uma família especialmente longeva: Rozika, a primogênita, chegou aos 98 anos e sua irmã Franziska aos 91.



Agradecimentos ao amigo Elson Antonio Gomes pela dica.

Fonte: MDIG

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