Medo
Visitante Noturno (Relato de um Leitor)
Saudações amigos e amigas. Na matéria de hoje vocês poderão conferir um relato enviado pelo amigo Rogério Santos, no qual ele fala de um evento assustador que aconteceu com ele na cidade de Santarém, no estado do Pará, quando, a noite, ele foi visitado por uma Entidade da Floresta. Convido a todos a conhecerem essa surpreendente história e algumas belas imagens registradas pelo nosso querido colaborador.
Visitante Noturno
Em julho de 2014, um amigo meu me convidou para passar um fim de semana numa chácara no lago da represa Curuá Una, localizada no município de Santarém, oeste paraense. Como gosto de aventura, topei. Fomos eu, ele, a esposa, a filhinha de uns cinco anos e um amigo dele. Carlos (nome fictício), costumava ir à represa pescar tucunaré com arpão. Saímos de Santarém por volta das oito da manhã. Pegamos o amigo dele no meio do caminho e seguimos rumo a Porto Novo, comunidade que fica na margem oposta à chácara. Conversamos muito durante o trajeto, compramos alguns provimentos e o dia estava ensolarado. Ao chegar em Porto Novo, pegamos uma lancha e cruzamos o lago. Como costumeiramente acontece no Brasil, a represa foi criada e construída numa região de floresta, sendo assim, havia centenas de árvores mortas dentro do lago. Um cenário desolador e, ao mesmo tempo, fantasmagórico. Ao chegarmos à chácara, havia um casal com uma criança já alojado na chácara. O marido pescando tucunaré. Juntamo-nos ao grupo. Carlos foi pescar tucunaré. Eu e o restante passamos o dia tomando banho, conversando e tomando uma cervejinha.
No período da tarde eu e Claudia, esposa de Carlos, fomos colher goiabas ao redor do sítio, cheio de seringueiras, buritizais e vitorias regias. Fizemos doce de goiaba no fogo a lenha, uma animação só. Senti vontade de urinar, a casa não tinha banheiro. Como sou apaixonado por fotografia, não era uma má ideia urinar na floresta e, de quebra, fotografar algo que considerasse esteticamente do ponto de vista fotográfico. Entrei displicentemente na floresta. Urinei, a tarde já caindo. Senti uma sensação de ser observado, mas desencanei, afinal estava literalmente no meio do mato, distante uma hora de Santarém e é absolutamente cabível sentir essa sensação de “vulnerabilidade”. No cair da tarde, os rapazes seguiram rumo ao meio do lago, numa bajara, para pescar tucunaré. Chegaram a me convidar a fazer parte do grupo, mas não aceitei. Sou muito cismado com água. Uma vez me afoguei e criei certa fobia com o elemento água. O calor estava beirando o insuportável; não havia rede elétrica. Na semana anterior, uma cascavel havia sido encontrada dentro da casa – na verdade, uma simples casa, as paredes de argila batida, teto de telha e fogão a lenha. Por isso, deitei-me na rede e nem ousei por os pés no chão. Já estava escuro e não havia muitas opções e não ser ficar prostrado na rede. Pensando na vida, pensando no nada.
Às onze e meia da noite os camaradas chegaram da pescaria. Ao longe dava-se para ouvir o burburinho. Criei coragem, sai da rede e fui me encontrar com os colegas: eles não havia pescado um tucunaré sequer. Decepcionante. Conversamos animadamente enquanto eles jantavam a luz de vela. Terminaram de jantar e foram dormir. Eu, especificamente, não consegui dormir por conta do calor e falta de brisa. A umidade na Amazônia, associada ao calor equinocial, dá uma sensação de desconforto absurda.
Por volta das três da manhã eu ainda estava acordado. O calor estava daqueles. Eu ouvi – estava de olhos fechados, esperando o sono chegar – um arrastar de passos, trôpegos, subindo a ladeira que dá para a casa. Rapidamente senti que não se tratava de humanos, uma vez que só existe essa casa na margem oposta à comunidade do Porto Novo. Ouvi o portãozinho de madeira ser aberto e a “pessoa” entrou no vão em que estávamos. Na verdade, dormíamos no terraço da casa. O homem veio e ficou em pé segurando o punho da minha rede. Fui tomado pelo pânico. Enormes porcos passavam por baixo da minha rede e a força era tanta que ela balançava de um lado para outro. Minha vontade era sumir daquele lugar naquele exato momento, pois estava estritamente em pânico. Essa sensação de estar sendo observado durou muito tempo, assim como a presença dos bichos embaixo da rede. Só sei que o “homem” se aproximou de mim e começou a falar algo ininteligível ao meu ouvido. Imagine a sensação de pavor que senti... em seguida ele passou por baixo do punho da rede e seguiu em direção à rede da filha do Carlos. A criança gritou assustada. Dei-me conta que eu não estava sonhando.
Conversei com alguns amigos aqui e eles me disseram ser comum as entidades da mata se apresentarem a determinadas pessoas, etc, eu lembro claramente que após a entidade se apresentar a mim, dormi. Mas lembro com detalhes daquela noite sombria e sempre que vou a comunidades no Tapajós ou Amazonas, eu antes de descer do barco peço licença. Não gostaria de vivenciar outra experiência dessa enquanto moro aqui, muito embora já tenha vivido outras. Essas, conto noutro momento.
Aqui na Amazônia, os ribeirinhos, seringueiros, mateiros, etc, tem vários códigos manejados simbolicamente para conviver com o rio e a floresta. Eles acreditam que estes espaços são propriedade de seres encantados e que todo o cuidado é pouco para conviver com “eles”.
Agradecimentos ao amigo Rogério Santos pelo relato e pelas belas imagens enviadas.
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