Tempestade em Snagov – O Tesouro do Conde Drácula (Parte 02)
Medo

Tempestade em Snagov – O Tesouro do Conde Drácula (Parte 02)



 No dia seguinte, os dois agentes do Sultão cruzaram a ponte para Snagov. O lugar era uma pequena
fortaleza, com muralhas sólidas e compactas. O portão era de madeira resistente, ricamente entalhado com várias figuras humanas em relevo.

Dentro dos muros havia três edifícios: uma velha capela, um prédio baixo talhado em pedra nua e bastante reforçado – morada dos monges, pensou o guerreiro – e a ciclópica igreja de três torres construída, por ordem de Drácula, pelos trabalhadores que jaziam, acorrentados, no fundo do lago. Kalil carregava a espada na cintura e uma série de instrumentos, entre eles pá, picareta, compasso, todos num fardo sobre o ombro. O alquimista trazia apenas uma ampulheta, uma pequena caixa cheia de frascos coloridos e o cilindro de couro que Kalil havia visto na noite anterior.


O pátio de Snagov era um lugar bastante agradável, mas eles não ficariam ali por muito tempo.

– Vamos. – disse Ghaji – Acho que é melhor começarmos pela grande igreja.
– Iremos checar as cúpulas?
– Bem que eu gostaria, mas duvido que seja possível.

A previsão de Ghaji logo se confirmou. Eles entraram na igreja, passaram pela nave vazia, cruzaram o altar – ao pé do qual havia uma grande laje, pintada com cenas de batalha – e encontraram a porta que dava para o sopé das torres.

A escuridão do outro lado da passagem era absoluta. Mesmo pela manhã, nenhuma luz chegava àquele recesso. O cheiro era uma mistura de cinzas, excremento velho, umidade e urina de morcego. Kalil não deu três passos sem sentir o contato viscoso com teias de aranha contra o rosto, mãos e pernas. Ele chamou pelo sábio, mas a única resposta foi o eco distante de sua voz, refletida pelas alturas.

De repente, surgiu a luz. Ghaji misturara as substâncias de alguns de seus frascos, e o resultado era um intenso brilho branco, que ardia sem produzir calor, a partir de um pequeno anteparo de bronze, que o sábio carregava como se fosse um castiçal.

– Perdoe pela demora, mas precisei voltar à nave para fazer a poção.
– Sem problemas.
– Olhe para cima. Como vê, jamais tocaremos as cúpulas.

As torres eram ocas, altíssimas e não havia meio de escalá-las. Nem escadas, nem mesmo apoios esculpidos na rocha. Ghaji aproximou-se de uma das paredes e esfregou-a com força, usando seu manto. Depois mostrou-o ao guerreiro: havia enegrecido.

– É carvão. Eles provavelmente usaram andaimes de madeira para erguer isso, e depois queimaram tudo aqui mesmo.
– Então, caso as cúpulas sejam feitas de ouro...
– Estão fora de alcance.
– Podemos trazer mais homens e erguer novos andaimes. – sugeriu o guerreiro.
– É verdade, podemos. – Ghaji parecia não prestar muita atenção no que Kalil dizia. – Mas, para não perdermos o dia, podemos também verificar os outros prédios.
– Você realmente não acredita que o ouro esteja nas cúpulas, não é?
– Não.
– E por quê?
– É óbvio demais. Quando há questões realmente importantes em jogo, aquilo que parece ser raramente é. Lembre-se disso.

Eles saíram da igreja em silêncio e se dirigiram ao templo mais antigo. Era uma pequena capela, com apenas uma torre. Nessa havia escada, mas tudo que encontraram ali foi um campanário com um sino de bronze. O resto da pequena construção era rocha nua.

O terceiro prédio estava cheio de móveis: mesas, cadeiras, catres. Pelo chão empoeirado havia até mesmo moedas de cobre e prata, abandonadas, talvez, na ânsia da fuga. A cozinha possuía um forno de pedra, grande o suficiente para assar um boi inteiro, e uma chaminé de tamanho proporcional. Exceto pelas moedas no chão, porém, não havia qualquer sinal de tesouro. No entanto, Ghaji sondava o chão da cozinha com especial atenção, percutindo-o com um pequeno martelo de aço, até que, num ponto à direita do grande forno, o piso soou oco.

– Me ajude aqui. – disse a Kalil, enquanto afastava a poeira com as mãos – Vamos.

O piso era de pedra maciça, exceto naquele ponto. Ali havia apenas uma lâmina de rocha, recobrindo um alçapão de madeira. Ghaji misturou mais um pouco de sua poção luminosa e derramou luz sobre o fosso.

– Há uma escada aqui. Quer descer?

Kalil balançou positivamente a cabeça. O alquimista lhe entregou a fonte de luz e o guerreiro desceu o lance de degraus, rumo ao piso inferior. Mais uma vez, as teias de aranha e o odor de decadência vieram embaraçar-se nele. O cheiro, no entanto, era muito pior, lembrava até um campo de batalha, dias após o embate, mas ainda antes da chegada dos coveiros.

Uma vez ao pé da escada, o soldado viu o motivo: aquela havia sido uma câmara de tortura e execução. Uma câmara marcada pelo excesso. Ao caminhar, Kalil apoiava os calcanhares sobre dedos, tíbias e costelas – que estalavam como gravetos secos –, seus pés chutavam crânios, que rolavam, esmagando ossos mais frágeis. Era como se o carrasco estivesse tão assoberbado que simplesmente deixava os corpos ali, sem tempo para remover a última vítima antes da chegada da próxima.

Havia corpos atravessados por espetos e apoiados horizontalmente sobre montes de cinzas mortas. Havia corpos pendurados no teto por ganchos e correntes presas às órbitas, aos cotovelos, aos joelhos. E, embora a carne da maioria já tivesse sido devorada pelos vermes, havia aqueles – e não eram poucos – marcados por torturas capazes de desfigurar os próprios ossos.

O guerreiro franziu o cenho, tentando forçar a vista para além do massacre. No entanto, a poção luminosa começava a emitir uma fumaça escura, que irritava os olhos. Havia celas nas paredes, ele pôde perceber, e o aposento onde se encontrava era circular, pequeno. O teto era incrivelmente alto e parecia sustentado por colunas e arcos em forma de ogiva, estruturas onde se projetavam, alongadas e fugidias, as sombras das vítimas de Drácula.

A constatação da altura o surpreendeu um pouco. Ele não se lembrava de ter descido tanto assim pela escada. Aquele lugar provavelmente estaria abaixo do nível do lago.

– Kalil...

Era a voz de Ghaji, chamando-o pela abertura, que agora parecia tão distante e diminuta, sobre sua cabeça.

– Ei, Kalil...

O guerreiro bocejou. A fumaça negra começava a deixá-lo com sono. Era difícil manter os olhos abertos. Sem obter resposta a seus apelos, Ghaji começou a fechar a abertura no chão da cozinha.

O guerreiro tentou protestar, mas sua boca estava pastosa. Não havia mais brilho na poção que o sábio lhe dera. O anteparo de bronze agora produzia apenas fumaça, cada vez mais espessa, que o impedia até mesmo de respirar.

A tampa de madeira já estava no lugar. Dentro em breve, o alquimista colocaria ali a laje de pedra. Então a escuridão veio, e era impossível dizer o que se apagou primeiro: a tênue réstia de luz do dia que ainda entrava pela cozinha ou o olho da mente de Kalil.

Continua...

Pessoal, só vou continuar se vocês comentarem...
(a não ser que não estejam gostando) 




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- Tempestade Em Snagov – O Tesouro Do Conde Drácula (final)
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